A relação entre a Atividade Solar e Terremotos: Fatos, Mitos e Fragilidades das Pesquisas
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| Imagem gerada por IA representando a possível interação do Sol com a Terra |
O que afirma a hipótese?
A hipótese básica é que a atividade solar, que inclui fenômenos como explosões solares, ejeções de massa coronal (EMC) e tempestades geomagnéticas, poderia influenciar eventos tectônicos na Terra, desencadeando terremotos. A principal justificativa seria que partículas altamente carregadas provenientes do Sol (prótons e elétrons) poderiam interagir com o campo geomagnético da Terra, induzindo correntes eletromagnéticas no solo, o que poderia alterar as tensões em falhas geológicas e, assim, desencadear terremotos.
Estudos que sugerem correlação
Alguns estudos, como os publicados na Scientific Reports e Astronomy Magazine, encontraram correlações entre a atividade solar e terremotos. Um estudo em particular sugeriu que, após picos de densidade de prótons solares, houve um aumento na frequência de terremotos com magnitude superior a 5.6 dentro de 24 horas. A hipótese propõe que essas partículas solares possam induzir correntes eletromagnéticas na crosta terrestre, desestabilizando falhas geológicas próximas ao seu ponto de ruptura.
Fragilidades e erros comuns nas pesquisas que sugerem correlação
Apesar das alegações iniciais, vários erros e inconsistências foram encontrados nos estudos que sugerem uma relação entre a atividade solar e terremotos. A seguir, eu resumi as principais fragilidades desses estudos. Lembrando que a leitura de um texto científico não é simples para uma pessoa sem formação e pode levar a conclusões erradas por parte do leitor. Eu, como Professor de Metodologia Científica em diversos cursos de Graduação fiz uma análise técnica de mais de uma dezena desses textos e com isso verifiquei um padrão de erros e fragilidades em todos eles.
Correlação não implica causalidade: A observação de que terremotos ocorrem logo após picos de atividade solar não prova que a atividade solar seja a causa dos terremotos. A correlação entre dois eventos não implica, necessariamente, que um esteja causando o outro. Sem um mecanismo físico claro para essa relação, essa correlação poderia ser meramente coincidência. Este é um erro comum em várias pesquisas que afirmam uma conexão, e estudos mais robustos tendem a refutar essa hipótese ao não encontrar uma causalidade direta.
Seleção enviesada de dados: Muitos estudos que sugerem correlações cometem o erro de selecionar apenas os eventos que suportam sua hipótese, ignorando dados que poderiam contrariá-la. Isso é conhecido como cherry-picking, e pode resultar em conclusões tendenciosas e não representativas da realidade. Por exemplo, eventos de alta magnitude são usados para mostrar correlação, enquanto terremotos de magnitude moderada ou menor são frequentemente ignorados.
Períodos de tempo curtos: A maioria dos estudos que tentam correlacionar a atividade solar com terremotos usa períodos de tempo muito curtos, geralmente de uma ou duas décadas. No entanto, os ciclos solares duram cerca de 11 anos, e a atividade tectônica da Terra acontece em escalas de tempo muito maiores. Estudos que utilizam períodos de tempo curtos podem superestimar as correlações ao capturar apenas variações temporárias, em vez de tendências de longo prazo.
Falta de um mecanismo físico plausível: Uma das maiores críticas à hipótese é a ausência de um mecanismo físico plausível que explique como a atividade solar poderia influenciar diretamente as placas tectônicas da Terra. Embora as tempestades solares possam induzir correntes eletromagnéticas na magnetosfera e ionosfera, esses efeitos são muito pequenos para influenciar processos profundos na crosta terrestre ou no manto. Estudos que propõem esse mecanismo muitas vezes carecem de suporte teórico sólido, e essa lacuna enfraquece seriamente a hipótese.
Métodos estatísticos fracos: Alguns dos estudos que sugerem uma correlação entre a atividade solar e terremotos utilizam métodos estatísticos inadequados. A aplicação inadequada de técnicas estatísticas pode levar a resultados que parecem significativos quando, na verdade, são apenas produtos do acaso. Pesquisas mais rigorosas, que utilizam grandes conjuntos de dados e modelos estatísticos avançados, geralmente não conseguem encontrar correlações significativas.
Inconsistências nos resultados: Um problema comum é que, mesmo quando alguns estudos encontram correlações, outros, usando dados semelhantes, não conseguem replicar esses achados. A replicabilidade é fundamental na ciência, e a falta de consistência nos resultados sugere que as correlações observadas podem ser meramente artefatos estatísticos. Muitos estudos que tentam reproduzir essas correlações acabam mostrando que elas não são estatisticamente robustas.
Foco excessivo em eventos extremos: Muitos estudos se concentram exclusivamente em grandes terremotos (de magnitude superior a 5.6), ignorando eventos menores e mais comuns. Isso pode criar um viés, já que terremotos de grandes magnitudes são relativamente raros e sua ocorrência pode ser fortuita, coincidentemente alinhada com picos de atividade solar. Além disso, terremotos menores, que são mais frequentes, muitas vezes não mostram o mesmo padrão de correlação com a atividade solar.
Falta de controle sobre outras variáveis: A atividade sísmica é influenciada por uma série de fatores tectônicos internos, como o movimento das placas e a pressão acumulada ao longo das falhas. Estudos que sugerem uma correlação entre terremotos e a atividade solar muitas vezes não controlam adequadamente essas variáveis internas, o que pode gerar falsas associações entre os fenômenos solares e a atividade sísmica. Sem isolar as variáveis corretas, é difícil determinar se as correlações observadas são devidas à atividade solar ou a fatores tectônicos subjacentes.
Simulações demonstram ausência de correlação: Estudos que utilizam simulações detalhadas e longos períodos de dados históricos geralmente não encontram correlações significativas entre a atividade solar e os terremotos. Essas simulações frequentemente mostram que as anomalias observadas podem ser reproduzidas aleatoriamente, sugerindo que as correlações observadas em outros estudos podem ser artefatos estatísticos e não reflexos de uma verdadeira relação causal.
Contradições entre estudos revisados por pares: Mesmo dentro da comunidade científica, há uma grande quantidade de contradições. Enquanto alguns estudos sugerem uma correlação entre picos solares e terremotos, a maioria dos estudos revisados por pares e mais rigorosos não encontra qualquer evidência de uma ligação sólida. A falta de consenso, combinada com os problemas metodológicos já mencionados, enfraquece significativamente a hipótese de uma conexão direta entre a atividade solar e os terremotos.
Apesar do interesse contínuo na possibilidade de que a atividade solar possa influenciar eventos sísmicos, a maior parte dos estudos rigorosos sugere que não há uma correlação estatisticamente significativa entre esses fenômenos. As falhas metodológicas, a ausência de um mecanismo físico plausível e a falta de replicabilidade nos resultados indicam que, se existir alguma influência da atividade solar sobre a tectônica da Terra, ela é, no mínimo, marginal.
Enquanto novas pesquisas podem aprofundar a compreensão desses processos, a evidência atual aponta para a conclusão de que a atividade solar não desempenha um papel relevante na geração de terremotos. Os estudos que alegam essa correlação, embora intrigantes, carecem de fundamentação científica sólida e são amplamente refutados por análises mais rigorosas. Portanto afirmar que atividades diversas do Sol são gatilhos para terremotos e erupções vulcânicas é um erro pois trata-se apenas de uma hipótese não comprovada!
Professor de Geografia
Especialista em Gestão e Manejo de Recursos Naturais
Mestre em Ensino das Ciências da Saúde e do Meio Ambiente
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